O mundo de TWD se organiza a partir dos mortos-vivos. Como uma paisagem que se estende infinitamente, os zumbis formam um horizonte interminável, intransponível, incompreensível e cruel. Desconectados de suas histórias pessoais, destruindo todos os registros, são o apagamento do passado. Como força apocalíptica, fazem do dia a dia dos humanos uma repetição interminável de luta pela sobrevivência, transformando cada momento do presente no que já foi e no que será. Esta mesma repetição, que dissolve o presente num instante sem fim, impede a construção de projetos e dissolve qualquer possibilidade de futuro.
A perda da referência temporal é acompanhada pela perda das referências espaciais. O fim do horizonte como visão do futuro encontra paralelo no fim do horizonte físico. Os horizontes espaciais que nos cercam oferecem elementos que estabilizam nossa identidade: vivemos numa determinada casa, circulamos por determinadas ruas, frequentamos determinados lugares, somos cidadãos de determinada cidade, estado e país. Ao despertar no hospital vazio e sair para a rua, Rick se vê no mesmo espaço em que era pai, marido, policial, vizinho, consumidor, enfim, um indivíduo. Mas essa teia de relações desapareceu e os espaços antes familiares, agora hostis e destituídos de significado, não servem mais referência para sua identidade.
Mergulhados nesse mundo inexplicável, onde tempo e espaço escapam de qualquer controle, é compreensível que o que assombra os personagens de The Walking Dead sejam questões existenciais. Quando não estão tentando explodir as cabeças dos mortos-vivos, estão conversando sobre religião, ética e valores morais e, frequentemente, sobre a identidade. A dificuldade para determinar o quanto há de humano nos zumbis conduz, naturalmente, à mesma dificuldade para definir uma ética humanista. Determinar o que há de humano nos zumbis implica em determinar o que há de humano em si mesmo.