Cada monstro que aparece numa história é imaginado de acordo com as referências culturais e códigos de valores da comunidade que o imaginou. Assim, cada monstro inventado pode nos dizer muito sobre uma determinada cultura, numa determinada época e numa determinada geografia. São metáforas do que assombra a comunidade que inventou suas histórias.
O Conde Drácula, a criatura do Dr. Frankenstein, o Lobisomem e Mr. Hyde são exemplos de monstros das sociedades ocidentais da Modernidade. Esses monstros nascem como metáforas de angústias específicas: o monstro de Frankenstein reflete a ansiedade do homem racional, que acredita ser capaz de ocupar o lugar de Deus, enquanto sua ciência substitui a empatia pelo mundo por sua destruição metódica e organizada.
Drácula remete às questões sexuais da Inglaterra em fins do século XIX, no declínio da Era Vitoriana. O perverso Mr. Hyde eclode de dentro do civilizado Dr. Jekyll, desafiando a crença de que o homem civilizado ocidental será capaz de criar um mundo melhor através da ciência e da tecnologia, ao mesmo tempo em que denuncia o lado sombrio do desenvolvimento tecnocientífico. No mundo contemporâneo, quando todas as referências herdadas da modernidade estão se desmanchando, o monstro que mais bem reflete nossas angústias é o zumbi: em suas histórias o mundo que conhecemos desapareceu e talvez por isto, diferentemente de seus predecessores, ele apareça sempre em histórias apocalípticas.
O zumbi dissolve a própria possibilidade de definição de “humano”. Diante da multidão de mortos-vivos o passado desaparece como referência, o presente é somente destruição voraz e não se avista a possibilidade de um novo mundo reconstruído. No apocalipse zumbi, nem mesmo a noção de morte e vida se sustenta com clareza.