O Mito do Monstro surgiu há dezenas de milhares de anos, como expressão da angústia existencial que nos assombra desde quando nossos ancestrais começaram a se perguntar: Quem sou? Assim, todos os monstros trazem questões de identidade. Suas histórias são um esforço simbólico para separar o humano do monstruoso. Mas, inevitavelmente, estas histórias acabam por revelar algo de humano no monstro, e de monstruoso em todo humano, e assim fracassam em nos proporcionar uma resposta. Esta é uma visão com base evolucionista, darwinista e freudiana, isto é, uma tese que considera nosso desenvolvimento intelectual e linguístico desde que nos tornamos seres sencientes, assombrados pelas questões da existência. Estamos sempre em busca de nosso lugar no mundo, a razão de existirmos. Podemos especular também que foi dessa angústia que surgiu a ideia de Deus, ou de deuses.
Há também uma explicação bíblica para o surgimento do humano. Em “A alma imoral”, o rabino Nilton Bonder observa que, no Paraíso, Adão e Eva viviam como todas as criaturas, apenas existindo e usufruindo das dádivas de Deus, sem nada questionar. Ao morderem a maçã, o fruto da árvore do conhecimento, tomaram consciência de si e do mundo. Adquiriram uma alma e, com ela, perceberam a própria nudez. Provar do fruto do conhecimento criou a consciência de Deus, a vergonha da nudez e, portanto, o julgamento moral. É a moral que busca separar o certo e o errado, o humano e o monstruoso. O corpo busca preservar-se e por isso é essencialmente conservador. A alma, por sua vez, é transgressora, busca o novo, a transformação e o diferente. A alma nos faz humanos. E nos revela que também temos algo de monstruoso, como na história dos dois primeiros descendentes de Adão e Eva: Abel se torna homem justo e piedoso, enquanto seu irmão Caim se revela um assassino cruel.